Cerrado está pegando fogo!

Cerrado está pegando fogo!

Julho foi o mês que mais queimou em 2024 no Brasil, num total de 1.260.459 hectares. Entre os biomas, o Cerrado registrou a maior área queimada, com 685.155 , seguido da Amazônia, com 419.169 ha. Mato Grosso, Tocantins e Amazonas foram os estados mais afetados pelo fogo no mês. No Cerrado, é comum queimar mais durante esta época por causa da estiagem, porém a área queimada no primeiro semestre no bioma foi a maior dos últimos seis anos monitorados (MapBiomas 2024). 

Procópia dos Santos Rosa, Monte Alegre de Goiás

Procópia dos Santos Rosa, Monte Alegre de Goiás

Filha de dona Maria e seu Manel, descendente de escravos, nascida na comunidade Kalunga Riachão, localizada à margem direita do Rio Paranã, na Chapada dos Veadeiros, no nordeste de Goiás, um lugar rodeado de serras e de difícil acesso, onde os negros fugitivos acabaram encontrando ali um lugar especial, bom de se morar e esconder, formando, assim, a comunidade kalunga, Dona Procópia dos Santos Rosa se destaca por sua força na luta em defesa de sua gente e de suas tradições.

Tudo o que ela sabe aprendeu com seus antepassados, que souberam se esconder muito bem dos brancos, mas ela conseguiu se sobressair, mantendo suas tradições e crenças. Ela não estudou, por isso não sabe ler e nem escrever, mas, em 2005, foi indicada ao Prêmio Nobel da Paz, pela luta em prol dos territórios e dos direitos dos kalungas. ““Não sei ler. Não sei nada de escola. Falar o que eu sinto é o que eu sei. Esse é meu estudo.”comentou Dona Procópia na época.

Esse saber natural permitiu que ela se tornasse co-autora do livro – Iaiá Procópia: Memória e Resistência Kalunga – onde, mesmo não sabendo ler ou escrever, coloca suas narrativas com tamanha clareza que permite ao autor apenas passar para o papel suas escrevivências.

Kalunga significa lugar sagrado, de proteção. E é ali, em sua comunidade, que a matriarca Iaiá, como é chamada, dá aconselhamentos, puxa as rezas, fala sobre plantação e colheitas. De rezadeira a parteira, ela não sabe quantas crianças ajudou a colocar no mundo, mas garante que foram muitas. A experiência fez com os partos tivessem sucesso, graças a sabedoria, orações, chás e remédios caseiros.

A matriarca, que sempre contribuiu para manter as tradições orais, culturais e religiosas da memória kalunga, ensinava rezas e a dança da Sussa, nascida de tradições africanas, e que reflete toda a alegria desse povo. Com um ritmo marcado pelo som da viola, do pandeiro, da sanfona e da caixa (espécie de tambor), é uma tradição que envolve toda a comunidade através da música e da dança, caracterizada por giros em que as mulheres equilibram garrafas de cachaça sobre a cabeça

Na indicação ao prêmio Nobel da Paz, Dona Procópia fez parte de uma lista de 1 mil mulheres de todo o mundo, e, destas, apenas 52 eram brasileiras. A indicação dela foi anunciada de forma simultânea para 40 países.

Dona Procópia foi a única goiana convidada para o prêmio, ganhando destaque por conseguir impedir a construção de uma barragem, no Rio Paranã, que alagaria boa parte do território kalunga. Foi por causa daquela indicação em 2005 que ela conheceu São Paulo. Foi naquele mesmo ano que Dona Procópia conseguiu levar água e energia para o Riachão. A conquista veio quando ela estava com 72 anos de idade.

Dona Procópia saiu pela primeira vez da comunidade Riachão para conhecer a cidade de Monte Alegre aos 50 anos de idade, aos 60 anos foi pela primeira vez à Goiânia lutar por melhorias na comunidade, reivindicando escola e energia, ao lado de uma amiga que já morreu.

“É uma mulher de saberes e fazeres”, afirmou a neta, Lourdes Fernandes de Sousa, de 37 anos, conhecida como Bia Kalunga. Segundo a neta, a avó é uma guerreira que não se rendeu às dificuldades. “Ela lutou e brigou tanto por nosso povo. Ela trouxe água, energia e escola para a comunidade. E ainda enfrentou e mostrou para todos nós que é capaz de superar, sempre”, revelou a neta. A escola chegou antes, em 1990.

Mãe de dois filhos, dona Procópia tem 12 netos, uns 48 bisnetos, 10 tataranetos, e mora sozinha. O marido morreu em 2010, depois de 57 anos de casados. “Não dá pra contar os bisnetos, mas é mais ou menos isso”, disse Bia.

Mesmo com dificuldades para andar e problemas na audição, por causa da idade, ela sabe da sua importância. “Quero mandar uma mensagem para as mulheres do Brasil todo. Para terem coragem, lutar, saúde para terem tudo o que elas desejarem, mas confiarem em Deus acima de tudo”. Ressalta a matriarca Iaiá.

Suas lutas são, até hoje, referência para a comunidade do Riachão que tem 68 famílias, sendo que em cada uma há uma média de cinco, seis, sete e oito pessoas, sendo a principal dessas lutas manter os costumes e tradições de seu povo.

Foi pensando nisso que a neta Bia é a atual administradora-geral do Museu Vivo Dona Procópia, um local com uma história pessoal e de seu povo. “É um local guardião da nossa cultura, da nossa história e foi idealizado por ela”, contou.

Bia é licenciada em Educação do Campo pela Universidade de Brasília (UNB), especialista em Língua Portuguesa Aplicada, poeta, escritora e professora na escola da comunidade.  “Não sei descrever meu sentimento. Cresci aprendendo com minha avó. É uma mulher que só trouxe conhecimento e ajuda para seu povo. Ela orienta, aconselha e acolhe. Ela sempre lutou pela paz e dignidade”, frisou, ao falar o que aprendeu com Iaiá (dona Procópia). O legado da matriarca é grande. Segundo Bia, todo o conhecimento da avó foi a base da necessidade, tanto dela quanto da coletividade.

Em relação ao Museu, o conselheiro da UEG, Marconi Burum, aponta que “O saber tradicional (que é o que dona Procópia passa para as pessoas, inclusive aos visitantes do Brasil e do mundo que vão conhecer o Museu Iaiá Procópia) não concorre com o saber científico. São saberes complementares. E esse saber de Procópia que tem mobilizado as pessoas de vários lugares e instituições a respeitarem o povo quilombola.” finaliza.

Fonte: https://ovetor.com.br/raizes-do-quilombo-reitoria-da-ueg-analisa-concessao-de-titulo-de-doutora-honoris-causa-para-dona-procopia-dos-santos-rosa/?fbclid=IwAR3cmgO1yUUx-ZdTG_fBUq-qe94u8wRwleQDXKNUOWASaKK2qhAhID8tpCE

Ela foi parteira, rezadeira, ‘dançadeira’ de súcia (dança típica da comunidade) e forte defensora do território quilombola quando houve ameaça de construção de uma usina hidrelétrica que poderia inundar a região. Com 91 anos, a líder tem dois filhos, 12 netos, 70 bisnetos e 15 tataranetos. 

Em 2005, Procópia foi uma das 52 brasileiras indicadas ao Prêmio Nobel da Paz, escolhidas por um comitê internacional, com sede na Suíça, composto por organizações não-governamentais feministas e de direitos humanos, para integrar o Projeto Mil Mulheres, apresentado à Organização das Nações Unidas (ONU).

Entrega do Título de Doutora Honoris Causa à senhora Procópia dos Santos Rosa 

O Conselho Superior Universitário da Universidade Estadual de Goiás (CSU|UEG) se reúne nesta quarta-feira, 7 de dezembro, a partir das 15h30, para a realização de sua 144ª sessão plenária.

Durante sessão solene será realizada a concessão do título de Doutora Honoris Causa à senhora Procópia dos Santos Rosa, por sua notória atuação na defesa do meio ambiente, na luta pelo reconhecimento do território Kalunga e promoção da paz entre os povos.

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Dg6DOOEanF8

 

Museu Iaiá Procópia

Referências:

BANDEIRA, Maria Lourdes; MIREYA, Suárez. LETRAMENTO E HISTÓRIA DE VIDA: AS MEMÓRIAS DE PROCÓPIA DOS SANTOS ROSA DA COMUNIDADE KALUNGA-RIACHÃO MONTE ALEGRE – GO. Universidade de Brasília – UnB: Brasília, 2014. Disponível em: 2014_LourdesFernandesDeSouza.pdf (unb.br)

GIRARDI, Giovana. A matemática que vem do quilombo. Revista Unesp Ciência: São Paulo, 2012. Disponível em: Violência, corpo e sexualidade: um balanço da produção acadêmica no campo de estudos feministas, gênero e raça/cor/etnia | Revista Brasileira de Sociologia – RBS (sbsociologia.com.br)

MUNIZ, Izadora Nogueira dos Santos; SIQUEIRA, José do Carmo Alves. PROTAGONISMO FEMININO NO PROCESSO DE RECONHECIMENTO E TITULAÇÃO DA COMUNIDADE QUILOMBOLA KALUNGA Revista Videre: Brasília: 2021. Disponível em: Protagonismo feminino no processo de reconhecimento e titulação da comunidade quilombola Kalunga | Revista Videre (ufgd.edu.br)

OLIVEIRA, Rosy de. O BARULHO DA TERRA Nem Kalunga nem camponeses. Universidade Federal do Rio de Janeiro: Rio de Janeiro, 2007. Disponível em: Microsoft Word – tese completa 18 de junho de 2008_1_.doc (columbia.edu)

Silva, Sonilda Aparecida de Fátima. Educação e empoderamento: histórias de resistência de mulheres kalunga. Pontifícia Universidade Católica  de Goiás, Escola de Formação de Professores e Humanidades, Goiânia, 2021. Disponível em: chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://tede2.pucgoias.edu.br/bitstream/tede/4710/2/Sonilda%20Aparecida%20de%20F%C3%A1tima%20Silva.pdf 

SILVEIRA, Elaine Machado; VELOSO, Elaina Oliveira. EDUCAÇÃO PROFISSIONAL A DISTÂNCIA: UMA REALIDADE NA COMUNIDADE KALUNGA EM GOIÁS. Associação Brasileira de Educação a Distância – ABED: Goiânia, 2018. Disponível em: www.abed.org.br/congresso2018/anais/trabalhos/170.pdf

SOUZA, Lourdes Fernandes de. Letramento e história de vida: as memórias de Procópia dos Santos Rosa da comunidade Kalunga – Riachão Monte Alegre – GO. 2014. 63 f. il. Monografia (Licenciatura em Educação do Campo) – Universidade de Brasília, Planaltina-DF, 2014. Disponível em: http://jbb.ibict.br//handle/1/1105

  • Sites:

LOPES, Arianne. A história de uma goiana indicada ao Prêmio Nobel da Paz; parteira e kalunga que nunca desistiu de lutar em prol de sua comunidade. Tribunal de Justiça do Estado de Goiás – TJGO: Goiânia, 2021. Disponível em: Tribunal de Justiça do Estado de Goiás – A história de uma goiana indicada ao Prêmio Nobel da Paz; parteira e kalunga que nunca desistiu de lutar em prol de sua comunidade (tjgo.jus.br).

MIRANDA, Dinomar. UEG concede o título de Dra. Honoris Causa a Dona Procópia dos Santos Rosa. Blog Dinomar Miranda: Brasília, 2022. Disponível em: UEG concede o título de Dra. Honoris Causa a Dona Procópia dos Santos Rosa – Blog Dinomar Miranda

REDEH- Rede de Desenvolvimento Humano. Procópia dos Santos Rosa. Mulher 500 anos atrás dos panos. Rio de Janeiro. Disponível em: Procópia dos Santos Rosa ( 1933 – ) – Mulher 500 Anos Atrás dos Panos

Dona Cinésia dos Santos Rosa, comunidade Ribeirão dos Bois, Teresina de Goiás

Dona Cinésia dos Santos Rosa, comunidade Ribeirão dos Bois, Teresina de Goiás

Dona Cinésia dos Santos Rosa, 92 anos é outra parteira que com orgulho descreve sua missão ou bela profissão de salvar vidas, como nos revela:
“Nasci no Vão de Alma na era de 23 de julho 1.922, fui casada no padre mas agora sou separada. Sou mãe de oito fios (filhos), cinco morreu e ficou três homens o mais véio nasceu no Vão de Alma e os outros nasceu aqui no Ribeirão. Não tive a oportunidade de estuda, tinha vontade de ir a escola, mais era muito difícil, então a escola era a roça. A profissão era parteira, o trabáio (trabalho) era na roça e ou fiava, tecia, cuidava de meninos meus e de outras pessoas. Foi através da minha avó que resolvi a ser parteira, pois toda a vez que ia fazer um parto eu ia junto para ela mi ensinar ai eu sabia que ia ter uma sabedoria”. DONA CINÉSIA
É importante ressaltar que as parteiras, aprenderam ofício (profissão) de parteira na maioria das vezes por falta de opções de estudos e outras profissões, ou por convivência com os mais velhos, as avós, que realizavam os partos e eram assistidas pelas netas ou filhas. A profissão de parteira para muitas começam cedo, muitas vezes por necessidade, situações que não há como fugir ou fingir que não esta acontecendo nada. De tudo que se observa nos relatos, há algo preocupante, que a continuidade desta linda profissão voluntária e de extrema necessidade em uma comunidade de difícil acesso, onde não há médicos, nem postos de saúde equipados para partos de caráter médico. É o que revela Dona Cinésia:
“Foi cum 20 anos que fiz o primeiro parto. Num ensinei ninguém porque a pessoa que eu queria ensinar não quis, porque ficou com medo. Nunca neguei de atender fora de hora nenhum chamado, pode cai chuva nas costas. Sinto orgulhosa quando faço um parto com sucesso e depois rezo pra Nossa Senhora do parto. Já fiz 114 partos, antes faço chá de cebola com pimenta do Reino com Noz – moscada pra induzir e aumentar a dor, depois do parto, folha de algodão com lagramina e nove dentes de alhos, soca junto, coloca um pingo de alcanfor e toma pra aliviar a cólica. Nunca perdi nenhuma criança no parto, toda a criança que peguei nasceu sadia. As vezes faço simpatia, tenho ela escrita, é só colocar ela encima da barriga pra dar força a mulher e desvirar o menino. Faço também o benzimento no momento que precisa, porque não pode fazer se não precisar” DONA CINÉSIA
Dona Cinésia deseja uma formação dentro das comunidades tradicionais para repassar esses saberes e para que essas práticas de sabedorias não se percam.

“Depois do parto, folha de algodão com lagramina e nove dentes de alhos, soca junto, coloca um pingo de alcanfor, entre outros e toma pra aliviar a cólica”.

“As vezes faço simpatia, tenho ela escrita, é só colocar ela encima da barriga pra dar força a mulher, e desvirar o menino. Faço também o benzimento no momento que precisa, porque não pode fazer se não precisar”.

 

Fonte: SANTOS, Suziana De Aquino. Os saberes e fazeres das parteiras na comunidade Kalunga, Ribeirão dos Bois, Teresina –GO. 2015. 43 f., il. Monografia (Licenciatura em Educação do Campo)—Universidade de Brasília, Planaltina-DF, 2015.

Dona Maria Pereira, comunidade Ribeirão dos Bois, Teresina de Goiás

Dona Maria Pereira, comunidade Ribeirão dos Bois, Teresina de Goiás

“Nasci no Vão de Alma, e me criei aqui no Ribeirão 20/04/1941, só mãe de dez filhos eles nasceram aqui na comunidade, não tive oportunidade de estudar porque meus pais num deixava, com medo de perde a virgindade. Escola só tinha em Cavalcante eu tinha tanta vontade de estudar, ser uma doutora, mas não tive condições e
oportunidades. Sou aposentada, trabalhei na roça, fiava e tecia cobertores de algodão, fazia o parto das mulheres da comunidade. Foi a necessidade num dia em que uma mulher estava comigo sozinha, sentiu a dor, fui obrigada fazer o parto dela, a partir daí comecei a ser enfermeira e nunca deixei de atender ninguém por falta de vontade seja a hora que for de dia e ou de noite. Sinto alegria sempre que realizo mais um parto. Fiz (66) sessenta e seis partos”.
Dona Maria nos revela ainda com simplicidade e suas palavras como procedia o trabalho de parto:
“nois já tinha o remédio né pra isquenta a dor da muié dava um ovo esquentado com a pimenta do Reino batia a gema du ovo, e dava pra bebe pra fica forti”, depois do parto tinha o vinho do algudão carrapicho e lagramina”. – D. MARIA PEREIRA)
Dona Maria Pereira vai desfiando um novelo de linha, ao mesmo tempo parece desfiar a vida, com uma riqueza de detalhes que faz os olhos lacrimejar, pela sensibilidade e humildade que revela a vida de parteira:
“Tudo que faço, vem primeiro nossa senhora do parto, porque eu não aguento vê ninguém sofrendo por falta de ajuda, sinto feliz porque tô ajudando essas mães. Entonce agente pega um caju com barú pra fazê banho de aperto depois de três dia e pra sara aos poucos. Os partos que já fiz e ajudei graças a Deus fui feliz nunca perdi nenhuma criança. Durante o parto não faço nada só a Fé em Deus” DONA MARIA PEREIRA
Dona Maria fala que no hospital os doutores não ajudam as mulheres do jeito que as parteiras ajudam na comunidade. Ela ainda diz que o que se passa durante o parto não pode revelar, porque as parteiras são iguais aos doutores e enfermeiras, tem de guardar segredo, não pode revelar a vida da paciente.
Observa-se que além de uma profissão não remunerada, é um trabalho voluntário, sem reconhecimento do poder público, porém as parteiras partilham de uma ética, ou seja, de valores de preservação da intimidade de suas pacientes e também de valores e crenças das mesmas na realização dos partos.

“Tudo que faço, vem primeiro nossa senhora do parto, porque eu não aguento vê ninguém sofrendo por falta de ajuda, sinto feliz porque tô ajudando essas mães. Entonce agente pega um caju com barú pra fazer banho de aperto depois de três dia e pra sara aos poucos. Os partos que já fiz e ajudei graças a Deus fui feliz nunca perdi nenhuma criança. Durante o parto não faço nada só a Fé em Deus” DONA MARIA PEREIRA

 

Fonte: SANTOS, Suziana De Aquino. Os saberes e fazeres das parteiras na comunidade Kalunga, Ribeirão dos Bois, Teresina –GO. 2015. 43 f., il. Monografia (Licenciatura em Educação do Campo)—Universidade de Brasília, Planaltina-DF, 2015.

Laurência Fernandes de Castro, comunidade Ribeirão dos Bois, Teresina de Goiás

Laurência Fernandes de Castro, comunidade Ribeirão dos Bois, Teresina de Goiás

“Nasci na comunidade Ribeirão dos Bois Município de Teresina Goiás, na era de 10/08/1935, nasci na roça, fui casada e agora sou viúva. Tenho sete fios (filhos) seis nasceu aqui só um que nasceu no município de Monta-Negue (Monte Alegre). Naquela época não tinha professor aqui, só na época dos meus meninos, sou analfabeta, trabaio (trabalho) na roça, sou partera (parteira). Durante minha vida trabaiei (trabalhei) na roça no cabo da enxada”.
As parteiras tem uma linguagem especial, específica dos quilombolas, parte delas foram preservadas nos relatos para melhor enfatizar a riqueza cultural e linguística da comunidade quilombola kalunga. O jeito de falar revela uma forma de comunicação com especificidades únicas que por outro lado preserva a cultura quilombola ao longo da história.
Dona Laurência revela como se deu todo o processo de inserção dela na vida de parteira voluntária, no trecho abaixo ela fala do assunto com muita precisão de detalhes:
“O que me levou ser partera foi por causa de minha mãe Joana, quando minha mãe ia pastejar (fazer parto), eu ia junto e ela foi mi ensinando fazer parto. Comecei com vinte e dois anos e fiz o primeiro parto de um minino lindo. Já insinei minha fia Dora e nunca deixei de ir atender ninguém seja a hora qui for de madrugada, de baxo di chuva com quibano na cabeça (quibano é um artesanato que usa pra peneirar o arroz). Sinto feliz porque o parto foi bom e já peguei (76) setenta e seis mininos aqui nessa região”.
Dona Laurência revela o ritual para realizar um parto feliz:
“Antes do parto eu faço o soro caseiro para esquenta e induzir a dor, depois, do parto outro soro para tirar a dor do coipo (corpo), manjericão, esponja, alho, algodão. Acho importante fazer parto, o primeiro que fiz foi muito emocionante e filiz, tô salvando uma vida. Nunca perdi nen um minino no parto Graças a Deus. Os parto qui fiz fui filiz e fiço com simpatia e benzimento, eu jafiço dois parto usando simpatia e benzimento, dipois eu tirei as criança igual um dotô(doutor), hoje essas crianças tão casados e filiz”. DONA LAURÊNCIA

“Os parto qui fiz fui filiz e fiço com simpatia e benzimento, eu já fiço dois parto usando simpatia e benzimento, dipois eu tirei as criança igual um dotô (doutor), hoje essas crianças tão casados e filiz”.

 

Fonte: SANTOS, Suziana De Aquino. Os saberes e fazeres das parteiras na comunidade Kalunga, Ribeirão dos Bois, Teresina –GO. 2015. 43 f., il. Monografia (Licenciatura em Educação do Campo)—Universidade de Brasília, Planaltina-DF, 2015.

Dona Delfina do Santos, comunidade Ribeirão dos Bois, Teresina de Goiás

Dona Delfina do Santos, comunidade Ribeirão dos Bois, Teresina de Goiás

Dona Delfina do Santos relata que nasceu no Vão das Almas, Município de Cavalcante, na beira de um córrego chamado Córrego da Serra, na área rural. Relata que é casada mais não no civil e sim no padre.
Com relação ao número de filhos ela diz: “Se tivesse ai tudo era treze filhos, mais Deus não quis, então eu tenho dez filhos vivos, cinco homens e cinco mulheres”.
Segundo Dona Delfina, os seus filhos nasceram na região que abrange o município de Teresina de Goiás. Com relação ao seu tempo de estudo, Dona Delfina revela:
“Na minha época não tinha escola aqui, meu povo não tinha condição de mi coloca pra fora pra mim estuda, o estudo era o cabo da inxada. Já trabaiei muito na roça e junto com meu marido ele era vaquero em fazenda” D. DELFINA
Sobre como aprendeu seu ofício de parteira, Dona Delfina afirma que “Por motivo de sua mãe Paula ser parteira, aprendeu com ela, a necessidade a levou a ter esse conhecimento e começou a exercer a profissão voluntária com vinte e dois anos, e continuou por muito tempo, agora está aposentada, mais por idade, mais se precisar, ainda pego menino, diz ela”.
Com relação à transmissão de seu conhecimento ela afirma não ter passado para ninguém e se justifica dizendo que “Não ensinei porque as pessoas novas não quer saber de aprender”.

Dona Delfina continua:
Todas as vezes que me chamava eu ia nunca neguei favor a ninguém, fico emprazerada (diz ela) porque deu tudo certo, o despacho ocorreu bem (quer dizer que o parto correu tudo bem). Eu já fiz 64 partos junto com minha mãe, para todos uso banho de sabonete virgem, com a folha da laranja e depois do parto usa os banhos de aperto (quer dizer banho vaginal), casca do caju, casca do jatobá, barbatimão e entre, outros. Quando a mulher ganha menino a placenta não sai, a gente pega o gergelim, leva no pilão, soca, tira o leite e leva pro fogo pra morna e da pra mulher beber, pra sai o resto do parto. DONA DELFINA
A solidariedade humana é a todo o momento relatada pela entrevistada, como no trecho que se segue:
“Acho importante para mim né e para quem tá grávida é uma forma de ajudar quem precisa, porque é um jeito que tenho de ajuda quem precisa. Nunca perdi nenhum menino no parto, sim mas não posso te dizer neste momento, mas vou te contar um acontecido comigo. Foi dona Cinézia, minha comadre que fez meu ultimo parto, nessa parição eu fiquei três dias ameaçada com dor, quando comadre chegou e tomou a frente e fez os benzimentos foi logo o menino pontou a cabeça pra nascer. Depois que o menino nasceu ela falou que eu não ia ter mais menino porque apinha (ovário ou aparelho reprodutor) já tinha secado, hoje meu filho caçulo tem 28 anos, ele chama ela de mãe Cinézia porque ela que pegou ele no parto quando eu tava parindo. Todos os meninos que nos pegamos chama nós de mãe porque nós é a mãe de pegação. Antes do parto rezamos pra dar tudo certo, depois para agradecer, como a Oração de Nossa Senhora do Bom Parto”.

 

Fonte: SANTOS, Suziana De Aquino. Os saberes e fazeres das parteiras na comunidade Kalunga, Ribeirão dos Bois, Teresina –GO. 2015. 43 f., il. Monografia (Licenciatura em Educação do Campo)—Universidade de Brasília, Planaltina-DF, 2015.

Dona Ramira, comunidade de São Domingos- Cavalcante-GO

Dona Ramira, comunidade de São Domingos- Cavalcante-GO

“Nasci e cresci aqui nestas terras não quero sair daqui, a cidade fica longe muito longe, as casas tem portão, esta casa era do meu avô e da minha avó com quem fui criada. Minha vó também fazia, minha vó era sabida, ela ensinava tudo pra nóis, Minha vó ensinou eu, aí peguei das minhas meninas já tem fia que já tem filho também fui eu que peguei”.

Todos os meninos aqui me chamam de mãe, peguei quase tudo, até os meus fui eu sozinha, só Deus e eu mais ninguém. Eu fazia os chás de cravo com folha de laranja, raiz de gervão, fazia o copo e deixava feito […] bebia de noite, aí eu bebia, bebia […] aí ia aumentando, aumentando quando dava a dor mesmo aumentada, eu Pá (som) […] fechava a porta ficava lá dentro sozinha. Deus e eu até o menino nascer. Eu nem gritava, não, eu tinha a criança as vezes custava despachar a placenta, aí eu chamava alguém, eu mesma cortava o imbigo. Quando eu sentava para ganhar os meninos já botava a tesoura, o novelo de linha tudo encostado […] (ela dá um sorriso), é minha fia só foi mais derradeiro, os primeiros tinha quem oiava pra mim também.

Às vezes a dor não quer aumentar, faz um chá de cravo com folha de laranjeira e dá pra beber aí esquenta a dor, aí aumenta a dor, aí aumenta a dor e quando tá sentindo muita dor assim […] toma chá de imburana, torra a vaginha de imburana e machuca faz o chá dá pra tomar, bonia é do brechio ela lastra assim no pau e dá vargem assim que nem banana cherosa, essa aí é boa para dor… uma vez vieram me chamar de madrugada , a lua já estava lá em cima, tinha outra parteira lá na casa, mas a mulher não tava despachando a placenta, daí eu fui, cheguei lá conversei com ela, fui no quintal peguei umas ervas, fiz massagem nas costas assim, e em seguida a mulher despacho a placenta e depois falei por que não tinham me chamado antes… (Sorrisos)”.

“Parto eu não dô conta pra você, eu já fiz mais de 100 (risos), me apego com Deus sempre que vô, quem manda é Deus, primeiramente Deus, toda a vez tem me ajudado, graças a Deus”.

Conversa com Dona Ramira, gravada em julho de 2013 por Marlini Dorneles de Lima.

Fonte: LIMA, Marlini Dorneles de. Entre raízes, corpos e fé: trajetórias de um processo de criação em busca de uma poética da alteridade. 2016. Tese (Doutorado em Artes) – Programa de Pós-Graduação em Arte da Universidade de Brasília, Brasília, 2016.

Aves, paisagens e cultura no Cerrado profundo

Aves, paisagens e cultura no Cerrado profundo

Aves endêmicas, paisagens deslumbrantes e a cultura Kalunga são os destaques desta incrível expedição off-road, que percorre uma das regiões mais fascinantes e preservadas do Cerrado Brasileiro.

Partindo da capital federal, exploraremos as áreas mais remotas e idílicas da Chapada dos Veadeiros em busca de aves. Seremos acolhidos e guiados pelos verdadeiros guardiões do Cerrado no maior quilombo brasileiro, o território Kalunga, e avistaremos espécies raras em um dos maiores complexos de cavernas da América Latina, o Parque Estadual de Terra Ronca.

Esta jornada de 9 dias, percorrendo aproximadamente 1.200 km, adentra territórios ricos em biodiversidade, história, cultura e geologia.

Contaremos com a condução do guia especializado, Marcelo Lisita, com mais de 10 anos de experiência em trabalhos de campo relacionados à ornitologia.

Participe desta expedição inédita e apoie a observação de aves como ferramenta para a conservação, valorizando os esforços daqueles que cuidam do Cerrado.

Venha viver esta experiência autêntica e imersiva no coração do Brasil!

Proteção da Estação Ecológica de Águas Emendadas

Proteção da Estação Ecológica de Águas Emendadas

 

A Estação Ecológica de Águas Emendadas (ESECAE) é essencial para a segurança hídrica da região e do Brasil. Criada em 1968, a ESECAE abrange cerca de 10 mil hectares e abriga a união das bacias hidrográficas Tocantins/Araguaia e Platina. Este fenômeno único alimenta rios vitais como o Maranhão e o São Bartolomeu, crucial para cidades, hidrelétricas e áreas agrícolas. Além disso, a ESECAE preserva uma área intacta de Cerrado, lar de espécies ameaçadas como anta, suçuarana, tamanduá e lobo-guará, sendo um importante núcleo de conservação e pesquisa reconhecido pela UNESCO.

INFELIZMENTE, A ESECAE ENFRENTA GRAVES AMEAÇAS: pressão urbana poluição expansão de agrotóxicos mudanças climáticas A proteção deste ecossistema é fundamental para a resistência contra os desafios climáticos. Por isso, nosso Mandato está promovendo uma Comissão Geral para debater sobre a proteção da Estação Ecológica de Águas Emendadas. Data: 08 de agosto Horário: 15h Local: Plenário da CLDF Venha debater e contribuir! https://www.instagram.com/p/C-GLaS0v4l9/?utm_source=ig_web_copy_link&igsh=MzRlODBiNWFlZA== Gabriel Magno Deputado Distrital PT/DF

Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo

Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou nesta quarta-feira (31/7) o Projeto de Lei n° 1.818/2022, que institui a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, após sobrevoar a região de Corumbá (MS), no Pantanal.                                                                                             

O PL sancionado pelo presidente Lula, que foi aprovado pelo Congresso no início do mês, cria a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo. A legislação impõe medidas para disciplinar e aprimorar o uso do fogo. O manejo integrado é uma abordagem planejada e coordenada para usar o fogo de forma controlada e consciente, com o objetivo de prevenir e combater incêndios florestais, conservar ecossistemas e respeitar práticas tradicionais. Essa estratégia combina conhecimentos técnicos, científicos e tradicionais para minimizar os impactos negativos do fogo, garantindo a segurança ambiental e humana. Inclui o uso controlado do fogo em atividades agropecuárias, de conservação e de manejo ambiental, sempre com autorização dos órgãos competentes. 

O texto proíbe usar o fogo como método de retirada de vegetação nativa para uso alternativo do solo, exceto quando há queima controlada dos resíduos de vegetação. Para práticas agropecuárias, o uso do fogo será permitido apenas em situações específicas, e os proprietários poderão ser responsabilizados em caso de incêndios. A iniciativa reconhece o papel ecológico do fogo nos ecossistemas e respeita os saberes e práticas tradicionais de uso do fogo por indígenas, quilombolas e outras comunidades tradicionais.                                  

#museucerrado #fogo #cerrado #manejointegradodofogo                                                                                                                             

Imagem: ISPN