Gestão participativa e conflito socioambientais em áreas protegidas no Cerrado mineiro: a pecuária de solta na RDS Veredas do Acari/MG
Autor(a):
Sílvia Laine Borges Lúcio
Resumo:
Os últimos trinta anos foram marcados por mudanças das políticas de conservação da biodiversidade à luz dos objetivos do desenvolvimento sustentável. Esta evolução, dentre outros fatores, foi baseada na promoção da gestão participativa dos recursos naturais e busca legitimar os conhecimentos tradicionais na conservação da diversidade biológica. No Cerrado, as discussões e iniciativas de gestão participativa ainda são muito incipientes. Por exemplo, algumas práticas tradicionais, como a pecuária de solta, sempre estiveram presentes neste bioma, mas ainda não foram incorporadas nestas mudanças. Devido à crescente privatização do espaço rural e à criação de unidades de conservação, as comunidades locais estão sendo “encurraladas” para não desenvolverem estas práticas, e garantirem sua sobrevivência. Neste sentido, por que parece ser tão difícil conceber modelos de gestão participativa de áreas protegidas do Cerrado incluindo a pecuária em pastagens nativas? Haveria possibilidades de manter/adaptar estas práticas na gestão destas áreas? Há duas hipóteses para estes questionamentos: os órgãos ambientais e formuladores de políticas públicas não conhecem e não reconhecem as práticas e saberes das populações locais e por isto não as levam em consideração. Assim, excluem estas comunidades do processo de gestão participativa e tornando-as “deslocadas” em seu próprio espaço, antes de permitir a privatização das áreas e antes de implementar uma UC. Por outro lado, as comunidades locais muitas vezes não conseguem ou têm muitas dificuldades em se posicionar diante do poder público como populações tradicionais, assumindo que suas práticas sempre conviveram com o Cerrado, com menores impactos se comparadas com o agronegócio. O objetivo desta dissertação é analisar a possível convivência entre gado solto e ações de conservação em uma área protegida do Cerrado. Para entender as dificuldades existentes para implementar modelos de gestão participativa foi escolhida a única RDS do bioma, onde a solta é praticada tradicionalmente há pelo menos 100 anos. A RDS está situada no município de Chapada Gaúcha (Minas Gerais). Foi realizada uma pesquisa participativa com os atores locais (criadores de gado e representantes do Instituto Estadual de Florestas). Esta pesquisa foi realizada em duas etapas, sendo a primeira a pesquisa exploratória e a segunda foram feitas as entrevistas e aplicado os questionários. Foi utilizada a técnica de mapeamentos participativos para entender melhor a história dos usos da terra da RDS assim como os usos atuais. Verificou-se que existe um conflito socioambiental, que envolve diferentes percepções entre os atores locais. O principal argumento do órgão ambiental para justificar a retirada do gado da RDS é o uso do fogo, prática tradicionalmente utilizada pelos criadores para rebrota do capim. À pecuária também é associada a impactos como erosão e assoreamento. Por outro lado, os criadores de gado afirmam que os processos erosivos foram provocados pela monocultura de eucalipto (em 1979). Eles afirmam ainda que o fogo, atualmente, é colocado por pessoas que não são dali. Ou seja, se veem injustiçados ao terem os impactos ambientais atribuídos exclusivamente à pecuária. Conclui-se, de acordo com o contexto local, que não será possível promover a gestão participativa junto aos criadores, enquanto o órgão ambiental não conhecer e reconhecer suas práticas.
Referência:
LÚCIO, Sílvia Laine Borges. Gestão participativa e conflito socioambientais em áreas protegidas no Cerrado mineiro: a pecuária de solta na RDS Veredas do Acari/MG. 2013. 123 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Sustentável)—Universidade de Brasília, Brasília, 2013.