Organizações denunciam criminalização de comunidades tradicionais e militantes no oeste da Bahia
O Coletivo dos Fundos e Fechos de Pasto da Bacia do Rio Corrente, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), a Comissão Pastoral da Terra – CPT/BA, a Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais da Bahia (AATR/BA), a Campanha Nacional contra a Violência no Campo, a Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares (RENAP) e a Escola de Ativismo vêm a público denunciar a escalada de criminalização contra militantes do MAB e comunidades tradicionais de Fundo e Fecho de Pasto no oeste do estado da Bahia.
Na última sexta-feira, 16 de maio de 2025, dois trabalhadores da comunidade tradicional de Brejo Verde, localizada no município de Correntina (BA), foram presos de forma arbitrária no aeroporto do Rio de Janeiro (RJ). Os detidos são Solange Moreira Barreto e Silva, camponesa, fecheira, agente comunitária de saúde e militante do MAB, e seu companheiro, Vanderlei Moreira e Silva, também camponês e fecheiro. O casal encontrava-se em viagem particular, planejada há anos, e foi surpreendido pela prisão sem qualquer esclarecimento prévio sobre as acusações que motivaram a medida.
Além deles, outros quatro integrantes da comunidade enfrentam mandados de prisão em aberto, sem que tenham sido formalmente informados das acusações. Desde a data das prisões, advogadas das organizações envolvidas tentam obter habilitação no processo criminal junto à Comarca de Coribe (BA), tendo seus pedidos reiteradamente negados. A realização de audiência de custódia sem o devido acesso da defesa aos autos configura violação grave aos direitos constitucionais ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo legal.
Os ataques jurídicos e policiais não se restringem às prisões. Na madrugada do dia 17 de maio, o rancho coletivo da comunidade de Brejo Verde foi destruído e incendiado. Relatos apontam também para a presença de seguranças privados armados no Fecho de Entre Morros, intimidando trabalhadores e impedindo o manejo tradicional do gado nas áreas de uso comum. No dia 19 de maio, viaturas das polícias Militar e Civil invadiram os territórios das comunidades de Brejo Verde e Aparecida do Oeste, arrombaram residências sem mandado judicial e ameaçaram familiares dos trabalhadores criminalizados, gerando um clima de medo, repressão e violência psicológica entre os moradores.
Desde a década de 1970, as comunidades tradicionais de Fundo e Fecho de Pasto denunciam sucessivas ações de grilagem, violência armada, destruição de bens comuns e omissão do poder público. A região do oeste da Bahia, especialmente o município de Correntina, figura entre os mais conflituosos do estado, conforme os dados da Comissão Pastoral da Terra, que apontam 132 ocorrências de conflitos agrários entre 1985 e 2023. Esse número tem crescido de forma alarmante nos últimos anos, refletindo o avanço do agronegócio sobre territórios coletivos e tradicionais.
O uso do aparato policial e judicial para intimidar, criminalizar e desmobilizar lideranças camponesas e tradicionais representa uma clara violação aos direitos humanos e territoriais dessas populações. Diante da gravidade dos fatos, as organizações signatárias desta nota reiteram suas exigências:
A libertação imediata dos trabalhadores detidos injustamente;
A habilitação das advogadas da defesa no processo criminal, garantindo pleno acesso aos autos;
A suspensão imediata das ações policiais em territórios tradicionais, especialmente as realizadas sem respaldo legal.
Leia a Nota de Denúncia e Repúdio na íntegra:
https://cptba.org.br/nota-de-denuncia-e-repudio
A Campanha Nacional em Defesa do Cerrado, em parceria com a Via Campesina Brasil, lançou a Nota Técnica intitulada:
“Política Territorial, Fundiária e Ambiental no Brasil – Balanço do Governo Lula 3”.
O documento foi entregue ao governo federal durante um seminário nacional sobre políticas fundiárias, reunindo movimentos sociais, organizações da sociedade civil e pesquisadores. A publicação apresenta uma análise crítica e fundamentada das ações e omissões do atual governo em relação à estrutura fundiária brasileira, à regularização de territórios tradicionais e à gestão ambiental.
Entre os principais pontos abordados estão:
a concentração fundiária histórica, agravada pela ausência de uma política efetiva de democratização do acesso à terra;
a paralisia ou lentidão nos processos de regularização de territórios indígenas, quilombolas e de comunidades tradicionais;
a fragilidade institucional na proteção de bens comuns e de áreas ambientalmente sensíveis;
e a relação direta entre a falta de políticas públicas estruturantes e o avanço das mudanças climáticas, sobretudo nos biomas Cerrado e Amazônia.