Maria Divina Cabral, raizeira cigana Calon.
Maria Divina Cabral, 66 anos, é uma mestra da cultura cigana em todos os sentidos. Diva, como é mais conhecida, nasceu a 25 de setembro de 1954, em uma barraca num acampamento na cidade de Mineiros (Goiás). Filha de Lázaro Alves Pereira e Lourdes Rodrigues Pereira, casou-se com o seu primo (filho da irmã do pai), Jair Alves Cabral, construindo e mantendo um profundo conhecimento da filosofia Calon e seu sistema de ação e organização sociocultural.
A Calin viveu boa parte de sua vida nos lombos dos cavalos, trafegando pelas cidades dos Estados da região Centro-oeste, até que no início da década de 70 fixou residência com sua mãe, pai, irmãos e parte de sua comunidade no município de Rondonópolis (a 210 km de Cuiabá, no sul do Estado). Mãe de duas filhas, Selma e Cleide, avó de quatro netas (Lorraine, Suiani, Leidiane e Cristiane) e três bisnetas (Cristina, Paula e Isabela); atualmente é a principal raizeira e benzedeira cigana no Estado, mantendo viva a medicina tradicional na comunidade Calon.
Membra fundadora da Associação Estadual das Etnias Ciganas de Mato Grosso (AEEC-MT), Diva é muito respeitada, por sua experiência e sabedoria na condução e salvaguarda de diversos costumes, narrativas e saberes da filosofia cigana. A sua participação e influência na comunidade, que reúne em torno de 300 pessoas no Estado, não se limita a Rondonópolis, chegando a outros municípios como Tangará da Serra, Cuiabá, Sinop, Guiratinga, Pedra Preta, Campo Novo dos Parecis e Alto Araguaia.
Apesar de nunca ter frequentado uma sala de aula, Diva é versada na língua romanó-kaló, que no Brasil é conhecida como chibe; sabe todas as simpatias, ervas apropriadas e rituais de cura infantis, aplicando-os em crianças ciganas e não-ciganas. TTambém produz remédios e unguentos naturais para casais com problemas de fertilidade e os mais diversos tipos de enfermidade, sendo conhecedora de uma variedade incrível de plantas medicinais do cerrado e da floresta amazônica.
Os saberes da medicina tradicional Calon foram aprendidos pela anciã ainda na infância, quando acompanhava sua mãe, Lourdes, ou as avós, Maria e Jordelina, às matas para a colheita das ervas e materiais orgânicos necessários à confecção dos remédios naturais.
A raizeira começou fazendo garrafadas para si mesma muito jovem, depois para os parentes e logo estava atendendo também aos não-ciganos, que passaram a cada vez mais procurá-la. Há cerca de 10 anos, desde quando sua mãe, dona Lourdes, se aposentou por problemas de saúde, Diva assumiu as suas funções como raizeira e também os cuidados com a matriarca, que morava na mesma casa até outubro deste ano, quando veio a falecer aos 87 anos.
Atualmente, Diva mora em uma modesta residência , na Vila Poroxo, porém, ajuda a todos que chega com rezas, benzeções, aconselhamentos e remédios. Aos que podem pagar, Diva pede uma contribuição, aos que não podem, ela auxilia da mesma forma. Já ajudou a milhares de pessoas em Mato Grosso e até mesmo de outros lugares do país, como Goiás e Minas Gerais. Sempre é chamada para reuniões de aconselhamento entre os seus familiares, mesmo os mais distantes.
Também é consultada sobre questões referentes aos inúmeros aspectos culturais e identitários Calon, como as leis do casamento, do luto e do funeral, o que a torna, definitivamente, uma mestra da cultura popular cigana mato-grossense e brasileira.
Em 2011, Maria Divina participou do filme documental É Kalon – Olhares Ciganos (35’), que foi patrocinado pelo Fundo Estadual de Cultura de Mato Grosso. E em 2015, foi lançado o curta-metragem “Uma Família Cigana”, que conta a história de sua família.
Já no ano de 2017, Diva participou do longa-metragem etnodocumental, “Calon Lachon”, que registrou, várias comunidades ciganas brasileiras e portuguesas e a peregrinação de Santa Sara Kali, que ocorre todo ano no dia 24 de maio na cidade francesa de Saintes-Maries-De-La-Mer. A produção está em fase de edição, tendo a raizeira como uma das principais personagens.
Assim, no ano de 2020, pelos relevantes serviços prestados à manutenção da cultura cigana e no apoio às comunidades ciganas e não-ciganas, Diva foi reconhecida pelo governo do Estado, por meio da Secretaria de Estado da Cultura, Esportes e Lazer de MT (SECEL-MT) como Mestra da cultura mato-grossense.
Fonte: https://galeriacalin.com/mestra-diva
Publicação:
PERPÉTUO, Lenilda Damasceno. Quantas pedras no meio do caminho?: representações sociais acerca dos Povos Ciganos e a relação com o trabalho e a educação escolar na Etnia Calon. 2021. 266 f., il. Tese (Doutorado em Educação)—Universidade de Brasília, Brasília, 2021, p.103-105. Disponível em: