A Educação Patrimonial constitui-se de todos os processos educativos formais e não formais que têm como foco o Patrimônio Cultural, apropriado socialmente como recurso para a compreensão sócio-histórica das referências culturais em todas as suas manifestações, a fim de colaborar para seu reconhecimento, sua valorização e preservação. Considera, ainda, que os processos educativos devem primar pela construção coletiva e democrática do conhecimento, por meio do diálogo permanente entre os agentes culturais e sociais e pela participação efetiva das comunidades detentoras e produtoras das referências culturais, onde convivem diversas noções de Patrimônio Cultural (FLORÊNCIO et al, 2014, p. 19). Notadamente a definição atual deixa evidente esse entendimento da educação patrimonial enquanto processo. Em outras palavras, isso significa uma construção junto à comunidade detentora daqueles bens culturais, sem a qual a educação patrimonial assume outras facetas que não compatibilizam com a ideia de uma ação dialógica e democrática. Nessa perspectiva, “educação como lugar de construção de um novo conhecimento a partir do diálogo e, portanto, de uma relação horizontal que valoriza os saberes populares e o outro” (SCIFONI, 2019, p. 29). Nessa esteira, adentra-se também em uma questão ética e social, de compromisso com a diversidade, que abre espaço para se pensar também em uma educação patrimonial decolonial. Essa reconhece que o colonialismo se perdura, assim como colocado por Boaventura Souza Santos, na forma da colonialidade do saber-poder, o que faz com que seja preciso refutar e irromper com os processos de dominação em relação às memórias historicamente inferiorizadas de grupos, bem como de outros segmentos sociais estigmatizados ou mesmo heterogênicos (TOLENTINO, 2018, p. 56). Muitos deles se dando por meios epistemológicos assim como igualmente apontado por Boaventura Souza Santos, ou seja, reconhecendo e colocando em xeque a ideia de um único conhecimento possível. Assim, uma educação patrimonial que pretende ser decolonial, além de partir e realizar essa desconstrução da lógica empregada pela colonialidade, deve primar por uma construção coletiva atenta às diferenças e pautada em uma participação efetiva dos sujeitos dentro destes processos. Isto é, uma construção ética que respeite as diferenças epistemológicas e culturais. De tal maneira, outra questão a se refletir e discutir acerca da educação patrimonial, e, portanto, a ser considerada, é seu caráter transversal. Habitualmente no âmbito da educação formal, a educação patrimonial, reiteradamente, fica a reboque do ensino de História, associada às visitações aos centros históricos urbanos e, por fim, se condensando em vários projetos. Predomina assim, a transmissão da historiografia tida como oficial das cidades e referente aos bens culturais, entretanto, sem levar em conta entre outros aspectos os significados que os sujeitos sociais atribuíram a esses bens culturais. Ao invés disso, defende-se que tanto no âmbito formal da educação quanto no informal, a educação patrimonial deve ser um processo transversal, logo, que não seja fechada a uma única disciplina (TOLENTINO, 2016, p. 44). Quando não se restringe a educação patrimonial apenas a uma disciplina, avoluma-se as possiblidades de desenvolver uma ação educativa suficiente e produtiva, ao passo que será possível pensar em diferentes dimensões das quais o patrimônio cultural é inerente. E por fim, mas não menos importante, após algumas pontuações e reflexões lançamos a ideia de que é preciso mais que conhecer para preservar – referência a máxima conhecer para preservar. Tal jargão compreende-se como uma das percepções do passado que se reproduz na atualidade, bem como frequentemente usada para justificar a exigência da realização das ações educativas. Reprisada à exaustão, no transcorrer do tempo, a enunciação levou a agregação naturalizada dessa noção, de forma que se tornou uma verdade irrefutável. Nesse sentido, se a expressão apresentava algum sentido frente a seu contexto histórico de elaboração, hoje, continuar a reproduzi-la pode representar despolitizar o debate acerca da função das ações educativas no tocante a preservação do patrimônio (SCIFONI, 2019, p. 17). No entanto, isso não significa que não é necessário e/ou válido conhecer e adquirir conhecimento sobre um bem cultural. “É certo que isso é uma condição, mas conhecer, por si só, não é suficiente para garantir a preservação dos bens culturais” (TOLENTINO, 2016, p. 45). Isto é, essa situação específica em torno da ideia de conhecer-levar conhecimento não necessariamente implicará na preservação de um determinado bem cultural. E é sobre essa problemática que se tem que debruçar e repensar a educação patrimonial, bem como o que se deseja com essa.
Assim sendo, diante da educação patrimonial aqui proposta e refletida, para que haja uma relação dialógica, ou seja, para que aconteça o diálogo entre os pares é preciso […] “empatia profunda e consideração pelo olhar do outro, disposição para aprender mais do que vontade de ensinar, pois não há diálogo possível quando o profissional do patrimônio organiza sua educação patrimonial para “levar o conhecimento” produzido na repartição” […] (SCIFONI, 2019, p. 29). E, nesse sentido, fica evidente também que tal educação patrimonial aqui pensada e defendida se repousa sobretudo, na escuta, no diálogo e na construção coletiva junta aos sujeitos e suas referências culturais. Para tanto, ao desenvolver um projeto de educação patrimonial, lembre-se de envolver a comunidade de forma ativa dentro deste. Realizar um processo de escuta acurado, debater junto com essa o patrimônio cultural, promover a reflexão crítica, considerar todos os conhecimentos de forma ética e democrática e ao final desde realizar uma avaliação de resultados. Esse é essencial para corrigir equívocos e promover ações educativas suficientes”.
SILVA, Ana Cristina Alves da. A atuação do Iphan – GO na promoção de ações em educação patrimonial (2009-2021). 2022. 169 f. Relatório Técnico (Mestrado em Estudos Culturais, Memória e Patrimônio) – Câmpus Cora Coralina, Universidade Estadual de Goiás, Goiás, GO, 2022.